Eu só posso rir, meu bem. Achar-te dançando com outras pernas, teus braços transpassados em outros pescoços, tua
boca a tomar doses generosas de um fel que de início parece doce, como era o nosso.
Perderei o juízo, arrancarei fios e mais fios, sinto a punhalada aqui,
homogeneidade quente que é vista e que também escorre, a olho nu, olho este,
que na ridícula tentativa de guerra (como são todas), pretendo arrancar, para
que sintas cego, a mesma dor que senti ao presenciar tua pupila dilatada por
outro alguém... mas não consigo, então cai você gritando compaixão, deito-me ao
teu lado, cospes em meu rosto, escarra com força, para que o barulho seja
prova da frivolidade que tu carregas nobre, mas que até então estava guardada no fundo do ser que és, espécie de mármore em tempo de geada, doente. Deixou-me
coisas sujas, o agrado que lhe dei nunca convinha, deveria ao menos ter notado
o esforço que fiz para prender os panos aos teus, mostrar calada que em meu colo
poderia ainda deitar, com ressaca de gente, com repulsa de mim... Eu, que te
ofereci o mundo e uma pitada de além, vejo teu dedo médio se erguer, quase
tocar a ponta do nariz que me faz respirar cansado, dou-te um riso e o punhal,
cravo em teu peito, com prazer morro junto, pois voltarei para ver escrito: “aqui jaz quem um dia me fez tanto mal”.